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A Companhia de Jesus e o Brasil

Quase contemporânea do “descobrimento” do Brasil, a Companhia de Jesus foi fundada em 1537, por iniciativa de Inácio de Loiola, cuja Fórmula do Instituto foi aprovada pelo papa Paulo III, na bula denominada Regimini Militantis Ecclesiae. Essa ordem religiosa foi incumbida de reagir contra o espírito da Contra-Reforma, movimento insurgente nascido em 1545, no Concílio de Trento, em decorrência da Reforma protestante.

Típica ordem missionária, a jesuítica se inspirara nos “Exercícios Espirituais” de Santo Inácio, levando seus adeptos a conquistar o mundo. Em lugar da imobilidade da contemplação monástica dos monges medievais, a Companhia de Jesus saía dos espaços reservados e procurava conquistar o mundo. A busca da glória de Deus importava na busca do profano pelo sagrado, sob ainspiração do lema: ad majorem Dei gloriam, com sacrifício, inclusive, da liturgia e de vários preceitos formais do cristianismo.

No Brasil chegaram alguns inacianos em companhia de Tomé de Sousa, constituindo a Província do Brasil, unidade subordinada à Assistência de Portugal, tendo formado, no século XVII, a Vice Província do Maranhão. O grupo que aqui aportou em 1549 era dirigido por Manuel da Nóbrega, Primeiro Provincial, imediatamente, iniciando a missão de aldeamentos da Companhia, além de fundarem colégios, a começar pelo Colégio da Bahia, instalado em 1553.

A tarefa educacional teve início antes que se completasse um mês do desembarque dos religiosos, tendo o irmão Vicente Rijo aberto escola de ler e escrever. O próprio Nóbrega relata: “O irmão Vicente Rijo ensina a doutrina aosmeninos cada dia e também tem escola de ler e escrever; parece-me bom modo este para trazer os índios desta terra ....”.

A partir do governo de Mem de Sá as missões se desenvolveram, tanto assim que, desde 1558, segundo Nóbrega, haviam escolas em todas as aldeias, sendo que a do Espírito Santo (Abrantes) era frequentada por 150jovens, ultrapassando, no mesmo ano, a soma de 200 alunos.

Apesar da indisposição dos índios para a disciplina e, mais ainda, para a vida religiosa não limitava, apenas, aos filhosdos colonos, o ensino ministrado. Isto porque, o próprio Anchieta declara, em 1584: “Em todas essas casas há sempre escola de ler, escrever e algarismo para os moços de fora”. Por sua vez, na Narrativa Epistolar de Fernão Cardim, esclarece que o ensino era geralmente concedido em tupi aos índios e em português aos filhos dos colonos. Segundo Frederico Edelweiss nas aldeias baianas, Espírito Santo, São João e Santo Antônio, tanto havia escolas como os meninos índios falavam português.

Costuma-se divulgar que os índios, protegidos pelos jesuítas, não foram vítimas da escravidão, conceito que se não sustenta, porque a escravização dos indígenas no Brasil colonial persistiu ou renasceu em diversas regiões. Tal ocorreu na expansão para o interior, em direção ao Maranhão e Pará durante os séculos XVII e XVIII. No litoral o mesmo ocorreu no século XVII, quando o apresamento dos índios das aldeias jesuíticas do Sul foi incrementado pela deficiência de escravos africanos na Bahia e no Rio de Janeiro, desde que Angola se encontrava sob o domínio holandês.

Vale insistir no manifesto interesse de os jesuítas aprenderem a língua tupi, preocupação assinalada nas informações de cada membro da Companhia, conforme se pode ler nas Cartas Jesuítas. Essa intenção era tão manifesta que, nas Cartas Avulsas, é mencionado o esboço de uma gramática, nos idos de 1556. O empenho em traduzir textos religiosos para a língua nativa também é mencionado pelo Pe. Navarro, em 1550. Muitos anos decorreram até que a gramática de Anchieta fosse impressa em Coimbra, no ano de 1595. Com algum intervalo de tempo foi impresso o catecismo do padre Antônio Araújo, em 1618, e pouco mais adiante, em 1621, surgiu a gramática do padre Luís Figueira.

O mesmo não ocorreu em relação ao léxico, cuja publicação fora estimada para ocorrer em 1592, juntamente com a gramática de Anchieta e o catecismo, nunca impresso pelos jesuítas. O uso desses manuscritos ficou restrito à Companhia de Jesus, tendo-se, todos eles, sido extraviados por ocasião da expulsão da Companhia realizada por Pombal.

Muitos anos decorreram até que, em 1938, o Prof. Plínio Ayrosa (USP) publicou e anotou, pelo Departamento de Cultura de São Paulo, o Vocabulário na Língua Brasílica, manuscrito Português – Tupi, do século XVII. Esse códice pertencera ao bibliófilo Félix Pacheco, sendo de autoria anônima, embora por muitos atribuído a José de Anchieta. Sem a posse dessa publicação fundamental é impossível estudar a Língua Brasílica, ou seja, o nosso Tupi.

Outras produções da lavra jesuítica tiveram grande circulação e foram bastante significativas, a exemplo dos “autos”, estritamente produzidos com objetivos catequéticos e com o exclusivo propósito missionário pedagógico. Por meio da dramatização de episódios da cristandade, incluíam de alguns elementos de pura feição na língua indígena, para, como é compreensível, obter melhor assimilação do gentio. Disso é exemplo o Auto de São Lourenço, em edição trilingue: português, tupi e espanhol, representado em Niterói pelos índios locais, exaustivamente estudado pela Profa. Dra. Maria de Lourdes Martins, cujo exemplar, anotado pelo Pe. Lemos Barbosa, tive o privilégio de adquirir.

Publicação: Tribuna da Bahia

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